Poderia ser mais uma trama ambientada no Rio de Janeiro, onde os pobres fariam os papéis engraçados e coadjuvantes. Mas parece que não.
Cheias de Charme chega trazendo a ajudante de bifê, a filha da empregada, o entregador de mercadinho, o advogado que se formou graças ao ProUni, o encostado pelo seguro-saúde do INSS e o locutor de FM que é quase um parente como personagens principais, tendo os ricos servindo de pano de fundo para contar suas vidas.
A classe C e D são as que mais consomem atualmente no Brasil, segundo diversas pesquisas. E a TV Globo, do alto de sua sabedoria – a meu ver – busca essa quebra de preconceito cultural e consumista. Por que não acredito que o intuíto de um enredo como este da nova novela das 7, seja buscar identificação com as classes menos favorecidas. Os mais pobres são os maiores devoradores de novela, seja passada na beira-mar do Leblon ou no Xingú. Eles se identificariam com qualquer uma…
A idéia é – ou não, em se tratando de televisão – apresentar esta ideologia popular às classes mais bem colocadas na pirâmide social.
Um pensamento bem lógico: se a classe C e D são as que mais gastam dinheiro e as A e B passam a aceitar isso, gera-se mais oportunidades para os mais pobres gastarem mais e mais. Quando a Som Livre lançou um CD da Banda Calypso ou prepara agora o de Gaby Amarantos é por filantropia? Ou crença no talento deles?
Querem mesmo é o dinheiro da novinha que é caixa de supermercado ou do cafussú que vende antena parabólica.
A prova é tanta que a audiência da novela é medida apenas no Rio e em São Paulo…
Impossível não associar Chayenne à Joelma e Fabian a Luan Santana, por exemplo. Os novos ícones de uma cultura que se construiu na necessidade do artista e do fã e que estão alí representados.
Digo necessidade porque a partir do momento em que se vende CD ou DVD por 10 reais, aquele pedreiro, que ganha pouco mais de um salário mínimo, pode comprar um exemplar e levar pra casa. Ele, domingo no quintal ou na laje do compadre, escuta durante o churrasco. Um mês depois aquela banda está fazendo um show em um clube perto de sua casa. A galera toda do churrasco comparece. É um ciclo que vem crescendo e rendendo lucro pra todo mundo.
É o pobre que vai nos shows todo final de semana. Que liga pras rádios e compra DVD original.
A novela me surpreendeu. Os personagens me parecem não estar estereotipados. Quem conhece sabe que são daquele jeito mesmo.
Os detentores do poder começaram a compreender o real valor do lado de cá desde o o momento em que nós mesmo descobrimos isso. A autoestima do nosso povo está respingando no lado de lá.
Sem sombras de dúvidas, ser brega estar na moda. Podemos ser vistos como exóticos pelos céticos, mas o fascínio de tanta criatividade deixa cair por água abaixo qualquer tipo de preconceito cultural.