Picolé de Alcalina
Já passava da uma da madrugada e o sono me consumia. Tinha acordado cedo naquele sábado e enfrentado um dia nada camarada. Mesmo estando hospedado na casa de amigo, tinha liberdade pra ditar a hora que iria me recolher. E assim fiz.
Acomodado no quarto de baixo, com os olhos pesados, mal reparei na cama de casal que me convidava a confortar meu fardo. Preocupei-me primeiramente com qual barulho o ventilador poderia emitir durante a noite e ao me virar pra o criado-mudo um objeto me chamou a atenção súbita.
Havia tempos que não ficava diante de uma raridade daquelas, contudo não ousei tocar em princípio. Já deitado na cama, tornava a olhar aquilo. Lembranças povoavam meu lúdico, recordei-me das inúmeras que eu possuía em casa.
Minha companheira naquela noite pessoense chuvosa e fria era uma fita K7.
Não lembro exatamente como a conheci. Quando dei por mim já a tinha dentro de casa e como grande companheira. Quer dizer, companheiras, pois ela logo se multiplicou.
Chega a ser engraçado, mas perto de minha casa havia uma locadora especialmente para elas. O CD era artigo de luxo na época, e poucos sabiam manipulá-lo. Sem dúvidas, a K7 reinava plenamente.
Me via encantado quando descobri que podia gravar, regravar e me auto-registrar naquela fita magnética. Mas isso é trela pra um outro post.
Locava as fitas, ouvia-as o dia inteiro. De Só Pra Contrariar à Banda Magníficos, o 3 em 1 da sala reproduzia. Daí chegou o momento de adquiri-las. Por que não? No camelódromo fazia minha festa. E comprava… Comprava…
As fitas ficavam alinhadas dentro de uma caixa de sapato inicialmente. Chegou a tempo de contabilizar as caixas em nove. Realmente era um vício: pra onde ia, seja na hora do recreio, no playtime ou mesmo no trajeto diário que fazia até chegar à casa de minha avó. Impossibilitado de carregar o som por questões óbvias, o portátil da época se fazia presente.
Eu tinha marcado nos dedos os botões de << e >> de meu Walkman azul. Criar afeição maior por determinada música era um tormento físico. Ter que voltar as músicas ouvindo aquele barulhinho e acompanhando pela brecha o movimento circular que a fita fazia, além de mandar pro espaço a carga das alcalinas, criava uma apreensão de que chegaria no meu destino antes mesmo de poder ouvir a música desejada.
A solução era sentar na calçada e esperar esse longo processo.
As pilhas que se faziam tão necessárias no funcionamento do walkman eram as primeiras a deixarem de colaborar, por segundo vinha os fones-de-ouvido. No caso dos fones, só comprando novos, já a pilha…
Recordo perfeitamente do ocorrido. E caso eu venha a esquecer, basta olhar a cicatriz que trago comigo há 13 anos.
O Rei do Gado era exibida às oito horas e eu tinha medo de assistir. Acho que era por causa dos italianos grosseiros da primeira fase. Na hora da novela estava impossibilitado de ligar o “treizão”, apenas o walkman me socorria. Havia o problema com as pilhas, que já passavam de 4 por dia.
Mas naquele eu resolvi seguir umas orientações.
“A pilha na geladeira se recarrega com o frio.”
Será? Nem questionei duas vezes! Quatro pilhas na bandeja dos ovos.
Ansiedade o dia todo pra comprovar se o mito era ou não eficaz. Não me contive e pra me certificar que nada daria errado na hora que os Berdinazzi e Mezenga entrassem no ar, e meus ouvidos estariam abafados ao som de Claudinho e Buchecha.
Achei que a bandeja dos ovos ainda não era frio suficiente. Imergi as quatros pilhas numa caçamba redonda que meu pai preparava gelo.
As pilhas congelaram. Evidente!
A caçamba de gelo parecia naquele instante um picolé da Rayovac.
Antes de começar a novela, meu pai se levantara pra beber água e ao perceber que o gelo continha zinco, cobre e sabe-se lá mais o que, deu-me uma cacetada na cabeça com o gelo, pilha e tudo mais que vi o sangue pingar no ombro.
Alarde! A intenção dele não era essa, decerto. E embora até hoje não saiba, aquilo me serviu pra acabar com o medo dos italianos, visto que naquela noite tive que assistir mesmo, e dali por mais algum tempo, até enfadonhar das fitas K7, fazia meu picolé de pilha em local separado.
Dentro de um copo!
Sabiia dessa cicatriz não… Hahahahahahahaha, adorei o título, tinha que vim de tu. Parabéns! Teu blog está massa!
Shay said this on 08/14/2009 às 21:38 |
Putz, que história, hein.
Ainda lembro quando as bandas anunciavam seus novos trabalhos na TV. Se era por gravadora grande, o final tinha a seguinte frase:
‘Lançamento em CD, LP e K7’
É, faz tempo!
Tiago Medina said this on 08/20/2009 às 23:33 |
KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK!!!!!
Amei!
muito bom… aposto q c o mesmo gelo q t abriu a kbça, vc colocou no corte p parar o sangramento. n foi?
socorrinho said this on 08/22/2009 às 18:10 |